NALDOVELHO

POESIA É ATO DE CORAGEM

Textos

COTIDIANO
NALDOVELHO

Hoje pela manhã, quando acordei, ao olhar para a cama notei que você não mais estava. Lavei o rosto, escovei cabelos e dentes, e no ar a impressão de que alguma coisa estava errada. De repente ainda estou dormindo, pensei! Ou quem sabe não de todo acordado.

Fui até a cozinha, um café bem quente, um cigarro bem tragado, para despertar as partes que ainda não estavam bem acordadas. Fui para o chuveiro, um banho bem gelado, depois para o quarto vestir a armadura e pronto: só faltava colocar a máscara.

Respirei fundo, desci a rua depressa. O ônibus não tarda, pensei! E o próximo custa a passar. Embarquei meio imprensado, engarrafado, na verdade esmigalhado e um tanto ou quanto embaralhado naquele mundo de gente, com a estranha sensação de estar no ônibus errado, com medo de perguntar ao motorista com cara de poucos amigos, mal humorado.

E foi assim desse jeito suado, que ao chegar no trabalho ao olhar para o relógio percebi: novamente atrasado! Fui para a minha sala, um monte de problemas acumulados, engavetados, um chefe que só se esconde e quando está, está irritado, quem sabe, também desmotivado? O paletó na cadeira, nunca responde, não resolve! Desse jeito, nada anda, só desanda e cada vez mais forte a sensação de que alguma coisa estava errada!

Ao chegar à hora do almoço, engoli a comida depressa, depois um café requentado, já meio frio e amargo, acender a muleta e um trago. O pulmão a reclamar o estrago, a denunciar uma respiração afrontada e uma forte pressão no peito, mais para o lado direito, uma certa dormência nos dedos, sei lá!

Voltei para as minhas correntes um tanto ou quanto mareado, dois maços fumados e o dia ainda na metade.

E ao anoitecer, com uma azia danada, de novo engarrafado, embaralhado num ônibus lotado, e numa freada arranjada, perdi o equilíbrio, e pronto! Sentei no colo errado! Uma mulher invocada achou que eu era um tarado, uma porrada no peito, quase fui linchado! Por sorte o Serafim, um meganha sarado, que mais parecia um anjo invocado e que a tudo assistia, fez valer sua autoridade, acabou com a bagunça e eu pude prosseguir. E cada vez mais desconfiado de que alguma coisa estava errada, eu só não sabia o quê!

Cheguei em casa bem tarde, o pulmão dolorido, três maços contados, mais a porrada no peito, e eu nem conseguia tossir. Um bilhete na porta e um silêncio danado. Acabara de descobrir que você não morava mais aqui.

Ainda me restam alguns cigarros e a tola esperança de que um copo de aguardente possa lavar esse dia e me ajudar até que a madrugada venha e traga em seu colo uma nova realidade. Quem sabe perder a hora? Quem sabe ao acordar, eu descubra que é sábado? Que foi tudo um sonho, um desses ruins? Que você não foi embora e está dormindo ao meu lado? Que é tudo culpa da maldita cachaça, da falta de ar e do cigarro? Quem sabe esta sensação estranha, não passe de uma brincadeira de mau gosto que o meu cotidiano costuma aprontar? Tomara!


NALDOVELHO
Enviado por NALDOVELHO em 12/06/2009
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